A Artista
Biografia
Muriaé, MG 1951, vive e trabalha no Rio de Janeiro desde 1978
Graduada em Letras pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Muriaé, MG, onde teve formação em piano pelo Conservatório Brasileiro de Música. Posteriormente no Rio de Janeiro concluiu o curso de mestrado em Literatura Brasileira na PUC. Entre 1988 e 1992 frequentou a Escola de Artes Visuais do Parque Lage no atelier de pintura e desenho, cursos teóricos de história e filosofia da arte. Paralelamente acompanhou grupos de estudos ministrados pelos professores e críticos de Arte, Paulo Venâncio Filho e Paulo Sergio Duarte. Frequentou também como aluna ouvinte as aulas do professor e crítico de arte Ronaldo Brito no curso de estética e história da Arte e Arquitetura na PUC, RJ.
Trabalhou em atividades profissionais na área de ensino,como professora substituta das disciplinas “Oficina de Criação bidimensional” e “Oficina de Criação tridimensional” no Instituto de Artes da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), em 2006; disciplina “História da Arte” no programa “Talento da vez”, Galpão Aplauso (Prefeitura do Rio de Janeiro) em 2005 e 2006; docente na disciplina “Plástica 1”, no Curso de Design de Interiores, Universidade Veiga de Almeida, campus Barra, RJ em 2003; manteve cursos e workshops para crianças no próprio atelier entre 2006 e 2009.
Em 1997 ganha o 1º prêmio do júri oficial da Universidarte em sua 3ª edição, RJ.
Foi selecionada pela Uniarte/Faperj para bolsa-pesquisa em artes visuais durante o ano de 2002, RJ. Recebe da Funarte o Prêmio Projéteis de Arte Contemporânea, em sua 3ª edição 2007 pela obra Jardim Suspenso, apresentada no Palácio Gustavo Capanema, RJ. Em 2013 foi selecionada pelo III Concurso Itamaraty de Arte Contemporânea para o prêmio-aquisição com o trabalho de pintura “Em obra II”.
Sua proposta de trabalho busca a integração entre as artes visuais, a arquitetura e a música. Apropria-se de materiais específicos e diferentes meios técnicos, tais como a pintura , o desenho, o objeto e a interferência no espaço, para desenvolver a idéia de interação entre o quadro,o canteiro de obras e a composição musical.
Curriculum
FORMAÇÃO ACADÊMICA
FORMAÇÃO COMPLEMENTAR
1973
Licenciatura em Letras: português e inglês.
Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras Santa Marcelina, Muriaé, MG
Formada em piano pelo Conservatório Brasileiro de Música, Muriaé, MG
1987
Mestrado em Literatura Brasileira.Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, PUC, Brasil
1988-1991
Atelier livre e cursos teóricos de Arte,Escola de Artes Visuais do Parque Lage, EAV, com destaque “Aprofundamento I”, Rio de Janeiro
1992-1996
Aluna ouvinte do professor e crítico de Arte Ronaldo Brito, nos cursos de Estética e Especialização em História da Arte e Arquitetura, Pontifícia Universidade Católica, PUC, Rio de Janeiro
1997
Grupo de estudo: aulas de História da Arte (da Antiguidade à Idade Média) e Arte e Ciência do século XV ao XIX ministradas pelos professores e críticos de Arte Paulo Venâncio Filho e Paulo Sérgio Duarte
PRÊMIOS E BOLSAS:
2014 Situações Brasília 2014, Brasília
2013 III Concurso Itamaraty de Arte Contemporânea (3ª edição), Brasília
2007 PRÊMIO PROJÉTEIS FUNARTE DE ARTE CONTEMPORÂNEA, Rio de Janeiro
2002 BOLSA UNIARTE/FAPERJ, pesquisa em Artes Visuais, Rio de Janeiro
1997 1º Prêmio do Júri Oficial da UNIVERSIDARTE (3a edição), Rio de Janeiro
1992 PRÊMIO PARTICIPAÇÃO no XVII Salão Carioca de Arte na Escola de Artes Visuais do Parque Lage, Rio de Janeiro
EXPOSIÇÕES INDIVIDUAIS:
2016/17
“...DE PROPRIEDADES QUASE MUSICAIS, NO ESPAÇO EM QUE SE MOVEM OS VIVENTES”, pinturas, desenhos e vídeo, curadoria de Fernando Cocchiarale, Paço Imperial, Rio de Janeiro
2012
EM OBRA II, (desdobramento )dois artistas, curadoria Agnaldo Farias, Escritório de Arte Gaby Indio da Costa, Rio de Janeiro
2010
EM OBRA, na FUNDARTE, Muriaé, Minas Gerais
2007
JARDIM SUSPENSO, Prêmio Projéteis Funarte de Arte Contemporânea, Palácio Gustavo Capanema, Rio de Janeiro
2005
AGENDA DO CONSTRUTOR, pinturas, Valu Oria Galeria de Arte, São Paulo
2002
PINTURA, Valu Oria Galeria de Arte, São Paulo
2001
O QUADRO, instalação composta de 1000 sacos de material de construção organizados em pilha como um grande painel, Espaço Cultural Sérgio Porto, Rio de Janeiro
1999
PINTURA, Valu Oria Galeria de Arte, São Paulo
1997
PAISAGEM PELO AVESSO, Paço Imperial, Rio de Janeiro
1996
PINTURA, Centro Cultural Cândido Mendes, Rio de Janeiro
1992
PINTURA, programa de exposições do Centro Cultural São Paulo, São Paulo
EXPOSIÇÕES COLETIVAS E PARTICIPAÇÕES NAS FEIRAS DE ARTE:
2016
PONTOTRANSIÇÃO artes visuais, obra “Entre”, instalação com sacos de algodão e de plástico, com areia, pedra e terra, curadoria Ceav-Funarte, Xico Chaves, Sonia Salcedo de Castillo e Luiza Interlenghi, Fundição Progresso, Rio de Janeiro
2014
SITUAÇÕES BRASILIA 2014, Prêmio de Arte Contemporânea, curadoria de Cristiana Tejo, Ricardo Sardenberg e Evandro Salles, Museu Nacional do Conjunto Cultural da República, Brasília
2013
NOVAS AQUISIÇÕES, Prêmio Itamaraty de Arte Contemporânea, Palácio Itamaraty, Brasília
2011
ANO 4, exposição comemorativa no Largo das Artes, Rio de Janeiro
2008
ARCO, Feira de Arte Contemporânea, Ano do Brasil, Madri, Espanha, representada por Valu Oria Galeria de Arte
2007
SP ARTE, 2ª edição, Feira de Arte de São Paulo, representada por Valu Oria Galeria de Arte
2006
NÚCLEOS CONTEMPORÂNEOS II, Valu Oria Galeria de Arte /São Paulo
WILTON MONTENEGRO: NOTAS DO OBSERVATÓRIO, fotografia da obra “PALCO”, Centro Cultural Telemar/Rio de Janeiro
2005
ORLÂNDIA II, interferência/ocupação de uma casa em obra, Botafogo/ Rio de Janeiro
ZONA OCULTA, ENTRE O PÚBLICO E O PRIVADO, obra “A BIBLIOTECA”, realização CEDIM/ Rio de Janeiro
2003
LAYERS OF BRAZILIAN ARTS, pintura, curadoria de Lesley Wright, Faulconer Gallery, Iowa, USA
QUATRO MATÉRIAS, exposição coletiva itinerante, SESC Petrópolis, Nova Friburgo, Volta Redonda e Rio de Janeiro
MOSTRA COLETIVA DOS ARTISTAS PREMIADOS, Bolsa Uniarte/FAPERJ, Museu de Belas Artes, Rio de Janeiro
ARCO, Feira de Arte Contemporânea, Madri, Espanha, representada por Valu Oria galeria de Arte
2002
INAUGURAÇÃO DO ACERVO DA UNIVERSIDADE ESTÁCIO DE SÁ, pintura, Campus Uruguaiana, Rio de Janeiro
ORGÂNICO EM COLAPSO, obra “A Biblioteca”, curadoria de Maria Alice Milliet, Valu Oria Galeria de Arte, São Paulo
2001
ORLÂNDIA I, interferência, ocupação de uma casa em obra,em Botafogo, organização dos artistas Ricardo Ventura e Marcia X, Rio de Janeiro
ARTISTAS BRASILEIROS, La Casa Elizalde, Barcelona, Espanha
ARCO, Feira de Arte Contemporânea, Madri, Espanha, Valu Ória galeria de Arte
1999
FIAC, Feira de Arte Contemporânea, Paris, França
MERCOARTE/OSSE, Museo de Arte Juan Carlos Castagnino, Mar Del Plata, Argentina
1998
MÚLTIPLOS, obra sem título, curadoria de Ruben Breitman, Valu Oria Galeria de Arte, São Paulo
1997
III UNIVERSIDARTE, Premiados da Universidade Estácio de Sá, Rio de Janeiro
1996
II Salão UNAMA de Pequenos Formatos, Belém
1994 e 1996
I e III Salão MAM da Bahia de Artes Plásticas, Museu de Arte Moderna, Bahia
1994
XIX Salão Nacional de Artes Plásticas, Palácio Gustavo Capanema, Rio de Janeiro
OITO, exposição coletiva com oito artistas, Centro Cultural da UFMG, Belo Horizonte/MG e Solar Grandjean de Montigny, Centro Cultural da PUC, Rio de Janeiro
1993
TENDÊNCIA MÚLTIPLA DO CONTEMPORÂNEO, Galeria Athos Bulcão, Fundação Cultural do Distrito Federal, Brasília
XVII Salão Carioca de Arte do Rio de Janeiro, Parque Lage, RioArte, Rio de Janeiro
1992
GALERIA DE ARTE UFF, Universidade Federal Fluminense, Niterói
POÉTICA DO MATERIAL, Galeria primeiro piso, Escola de Artes Visuais do Parque Lage, Rio de Janeiro
1991
PINTURAS RECENTES, duas artistas contemporâneas, Galeria Contemporânea, Rio de Janeiro
XVI Salão de Arte de Ribeirão Preto, São Paulo
XIII Salão Nacional de Arte de Belo Horizonte, Minas Gerais
1990
“APROFUNDAMENTO”, Escola de Artes Visuais do Parque Lage, Rio de Janeiro
XIII Salão Paulista de Arte Contemporânea, São Paulo, São Paulo
Professora das disciplinas “Oficina de Criação bidimensional” e Oficina de Criação tridimensional no Instituto de Artes da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, UERJ, 2006; professora da disciplina “História da Arte” no programa “Talento da vez”, Galpão Aplauso (Prefeitura do Rio de Janeiro), 2005 e 2006; professora da disciplina “Plástica 1”, no Curso de Design de Interiores, Universidade Veiga de Almeida, 2003; manteve cursos e workshops para crianças no próprio atelier entre 2006 e 2009.
PARTICIPAÇÃO NOS SEGUINTES SALÕES DE ARTE CONTEMPORÂNEA:
1994 e 1996 I e III Salão MAM da Bahia de Artes Plásticas, Museu de Arte Moderna, Bahia
1996 II Salão UNAMA de Pequenos Formatos, Belém
1994 XIX Salão Nacional de Artes Plásticas, Palácio Gustavo Capanema. Rio de Janeiro
1993 XVII Salão Carioca de Arte do Rio de Janeiro, Parque Lage, RioArte, Rio de Janeiro
1991 XVI Salão de Arte de Ribeirão Preto, São Paulo
1991 XIII Salão Nacional de Arte de Belo Horizonte, Minas Gerais
1990 XIII Salão Paulista de Arte Contemporânea, São Paulo, São Paulo
COLEÇÕES PÚBLICAS:
Ministério das Relações Exteriores, Palácio Itamaraty, Brasília
Centro Cultural Cândido Mendes (2), Rio de Janeiro
Centro Cultural da Universidade Federal Fluminense, Niterói
Universidade Estácio de Sá, Rio de Janeiro
Obras
Texto
“…DE PROPRIEDADES QUASE MUSICAIS, NO ESPAÇO EM QUE SE MOVEM OS VIVENTES”.
Sobre a construção de “propriedades quase musicais, no espaço em que se movem os viventes”.
A exposição “… de propriedades quase musicais, no espaço em que se movem os viventes” (título extraído por Ana Muglia de trecho de Eupalinos ou O Arquiteto, de Paul Valéry) é, segundo declaração da própria artista, “uma mostra de pintura em madeira de grandes formatos, série de desenhos sobre tela crua em pequenos formatos, algumas folhas do Caderno de artista sobre suporte de madeira e base de concreto e um vídeo, cujo foco é trabalhar as semelhanças visuais e rítmicas entre o espaço da construção arquitetônica e o da estrutura musical”.
Os diferentes meios técnicos utilizados por Muglia nesses trabalhos nos remetem às categorizações convencionais que traçavam, até recentemente, as fronteiras entre pintura, desenho e escultura.
Nesse sentido, destacamos trechos de seu depoimento que, direta ou sutilmente, evidenciam o fio condutor pictórico que atravessa o conjunto de sua produção: “uma mostra de pintura em madeira de grandes formatos”, “desenhos sobre tela crua”, “Caderno de artista sobre suporte de madeira” e vídeo sobre “semelhanças […] entre o espaço da construção arquitetônica e o da estrutura musical”.
Mas para a compreensão do sentido poético específico dessa pintura de Muglia que transborda os limites convencionais entre desenho, escultura e música é necessário averiguar tanto o sistema pictórico que norteia sua fatura (a escolha dos materiais de que são construídas e que as estruturam), quanto confrontá-la com questões pictóricas e poéticas formuladas pela arte moderna e por seus desdobramentos na produção contemporânea.
A redução da pintura aos seus atributos objetivos essenciais, concentrada na reiterada afirmação do plano pictórico (oposto à representação naturalista e ao ilusionismo permitido pela perspectiva e pelo sombreado que a marcaram entre a Renascença e a modernidade) deixou clara a importância do suporte ou das superfícies em que eram pintadas.
Tais suportes conectavam a atividade pictórica propriamente dita à superfície de um plano materialmente objetivo. Era necessário vencê-lo para a o triunfo da simulação do espaço (ou da cena) que acolhia a representação. Pinturas seriam, então, inseparáveis dos diferentes espaços que as acolheram e as perenizaram milhares de anos antes da invenção da escrita, portanto, antes de qualquer narrativa histórica. Dentre esses suportes, destacam-se a parede (de cavernas, templos e palácios) e, mais recentemente, a tela e o papel.
Foi somente a partir da segunda metade do século XIX, com a formação das primeiras vanguardas europeias, que a materialidade planar do suporte pictórico se generalizou para consolidar a modernidade aspirada. A produção artística, entretanto, continuou a explorar e a aprofundar novas possibilidades poéticas inauguradas pela investigação do plano pictórico.
Já na segunda metade dos anos cinquenta, Lucio Fontana, na série de pinturas Concetto spaziale, começou a fazer incisões com navalhas ou tesouras sobre telas monocromaticamente pintadas.
As incisões de Fontana nos revelavam de imediato que, ao contrário do conceito teórico de plano (Euclides), o plano pictórico – tela − possuía concretamente uma fina espessura: um outro lado que confinava com a parede sobre a qual o quadro era situado. Havia aqui uma crítica à “dimensão planar” que celebrava a superfície do suporte da pintura modernista, destinada à composição.
Muglia ultrapassa o debate sobre o plano pictórico para extrair das entranhas da parede, invisíveis ao olhar fruidor e à compreensão habitual, a organização material, espacial e cromática de seus trabalhos. É, portanto, uma pintura de afloramento, que reconstrói tais entranhas na superfície dos trabalhos. Finalmente é preciso esclarecer que diferentemente do construtivismo histórico, baseado em noção de estrutura análoga à da engenharia do ferro, as construções da artista exploram, sobretudo, a potência pictórica dos materiais por ela apropriados da construção civil brasileira (de onde extrai a sutil precariedade de sua pintura).
Fernando Cocchiarale
Novembro, 2016
Texto
“ENTRE”
Para a realização deste trabalho ocupei o piso na sua horizontalidade criando intervalos entre pequenas colunas em alturas diversas. Barricada desmontada. Espaços de silêncio. Circulação livre em várias direções. Entradas e saídas pelos “entre”. Pausas deitadas. Altos e Baixos na com/posição. Vista aérea: superfície pictórica de um quadro.
Foram utilizados cerca de 800 sacos plásticos transparentes e de algodão branco com material de construção selecionados entre areia, pedra e saibro, montados em pequenas e médias amarrações distribuídas sobre o chão, em dimensões variadas, separadas por intervalos delimitados. O trabalho foi pensado a partir da idéia da construção de muros (visualmente semelhantes a barricadas) normalmente utilizados como impedimento da passagem para o outro lado. No entanto a obra “Entre” , como o próprio título sinaliza, desestrutura o muro e cria espaços ou intervalos entre as amarrações deitadas sobre o chão para que haja livre circulação em qualquer direção.O formato aqui proposto ressalta a idéia de abertura, cuja finalidade é a travessia entre um espaço e outro, sem barreiras”.
A arquitetura local com ferragens aparentes e cor terrosa com paredes descascadas e chão de cimento foi o ambiente propício para instalar o meu “canteiro de obra”, ideal para abraçar a minha montagem.
Exposição coletiva Ponto Transição Artes Visuais realizada na Fundição Progresso
Rio de Janeiro, 04 de Agosto de 2016
Imagens
Texto
TENSÃO / EXPOSIÇÃO ANA MUGLIA E RAFAEL PAGATINI
Agnaldo Farias, Rio de Janeiro, November 2012
As pinturas/objetos de Ana Muglia deixam ver o tempo dispendido em sua execução, todos os variados passos concernentes a um caminho longo, tortuoso e profundamente meditado, no qual os protagonistas são as mãos e os olhos guiados por uma engenharia fundada no improviso e na capcidade de articular elementos díspares. Há um quê de parede em suas pinturas. Ou de tapume. Qualquer coisa indecisa entre um e outro e que nasce do desejo de vedar, construir um anteparo que, ademais de sua superfície movimentada, atrai pelas frestas obtidas. Pinturas no geral, nascem do desejo de sublimar a existência das paredes em que vem fixadas.
São uma outra coisa, pretensamente mais especial. Mas não no caso de Ana que prefere produzir paredes, esse elemento que trai o desejo ancestral de isolamento, de abrigo. Como escreveu Osman Lins: “as paredes (de uma casa) impedem que nos dissolvamos na vastidão da terra. Nossa artista traz para a frente o que está por detrás, ativa-a, trabalha sobre ela até finalmente deixá-la num estado de inacabamento permanente. Vemos todas suas decisões, supressões e acréscimos, as marcas de suas ações que se vão depositando num plano que tanto pode ser grande como a parede de uma casa, como essas que ora ela apresenta logo à entrada da galeria, como nas telas de pequeno formato, onde esse labor resolve-se em solução camerística.
(Extrato retirado do texto para a exposição em dupla com Rafael Pagatini realizada no Escritório de arte GABY INDIO DA COSTA, Rio de Janeiro, 2012)
Imagens
Texto
work in progress 2012
Imagem
Texto
EM OBRA
Katie van Scherpenberg, Rio de Janeiro, Novembro de 2010
A palavra Arte significa, na sua origem, uma maneira de fazer. A arte da música,da pintura,da escultura.Maneiras de fazer uma obra.
Nos trabalhos parecendo ainda em obra,inacabados, percebemos pelas frestas, nesgas de parede,sombras,áreas ainda descobertas. O tapume afinal esconde alguma coisa que está por vir.
A obra se torna um objeto que tem por fim esconder algo ainda em construção. O espectador se torna cúmplice na procura pela imagem. Como uma partitura musical que esconde a música atrás de suas pautas e que precisa do artista para ser materializado.
O que é importante neste trabalho paciente de revelação e dissimulação é a imagem sonegada ao olhar indagador. A artista constrói algo que não se percebe de imediato e temos vontade de pular o tapume a fim de vivenciar o mistério que se esconde atrás.
Não temos acesso a ele a não ser pelo conceito ou pela imaginação.
Entanto um objeto foi criado,realizado, construído ; madeira, pigmentos, argila, concreto.Ela existe e está na nossa frente.
Será a imagem perdida afinal o próprio tapume?
Exposição individual na FUNDARTE, Muriaé, 2010
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Texto
JARDIM SUSPENSO
Jardim suspenso se apresenta como uma “obra” que ao mostrar sua estrutura utiliza recursos em que o ritmo e a pintura são pensados a partir das suas relações com o espaço arquitetônico. Erguido como um muro recortado, interessa aqui o olhar atento que invade suas frestas e acompanha o movimento que demarca a divisa entre o que já é, e o que pretende ser em um processo que se constrói.
Ana Muglia, Rio de Janeiro, 2007
Prêmio Projéteis Funarte de Arte Contemporânea, 2007
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Texto
CALENDÁRIO
Madeira, vergalhões, tijolos, papel pautado sobre papel paraná 2006
Imagens
Texto
AGENDA DO CONSTRUTOR
Parte da série “Agenda do Construtor” foi mostrada na exposição “Em Obra”, exposição individual na FUNDARTE, Muriaé, Minas Gerais 2010
“Agenda do Construtor” (exposição individual) na Valu Oria Galeria de Arte, São Paulo 2005
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Texto
PRANCHETAS
PARTE DA SÉRIE PRANCHETAS FORAM MOSTRADAS NAS EXPOSIÇÕES:
“Em Obra” exposição individual na FUNDARTE, Muriaé, Minas Gerais 2010
Agenda do Construtor (exposição individual)na Valu Oria Galeria de Arte, São Paulo 2005
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Imagens
Texto
A BIBLIOTECA
Face à destruição e à desordem, a proposição é de reordenação do caos, a começar pela escolha dos escombros. Os detritos são ensacados como livros numa biblioteca. É um jeito de recomeçar a partir do que sobrou, uma construção que só dispõe dos restos, metaforicamente um discurso situado na ronteira entre o saber ultrapassado e o novo saber.
Imagem
Texto
DAQUILO QUE AS COISAS SÃO FEITAS
Paulo Reis, Rio de Janeiro, 2003
A pintora Ana Muglia “organiza” uma barricada de sacos plásticos e tecidos recheados de brita, areia e argila, retomando o modelo primordial dos materiais ainda como são usados nos seus estados naturais (como se fosse possível conceber estados naturais quando o homem se utiliza dos materiais industrializando-os para construir espaços habitáveis). Contudo, apesar de seu caráter tridimensional, não devemos ver esta obra como escultura e sim pintura, pois, nas palavras da artista: “Ainda estou fazendo pintura, pois quando disponho os elementos sob a ordem rigorosa das cores, o espaço representado é o mesmo de quando faço minhas pinturas”. Apesar de seu volume e peso _ elementos do universo da escultura, a obra, para a artista, deve ser tomada como uma pintura-objeto. Ana Muglia insere-se, com esse objeto híbrido, nas discussões da arte contemporânea a partir das heranças da arte povera, do brutalismo dubuffetiano, dos penetráveis de Hélio Oiticica, do informalismo de Burri e Tápies, do espacialismo de Fontana e de uma gama de referências na história da arte moderna.
(texto retirado do folder para a exposição itinerante “Quatro Matérias” realizada no SESC Petrópolis em 2003)
Imagens
Texto
PAISAGEM PELO AVESSO
“… ao passear por esta cidade,
observaste que,
dentre os edificios que a compõem,
uns são mudos, outros falam;
e outros enfim,
mais raros, cantam?”
Paul Valéry (citação)
exposição individual Paço Imperial, Rio de Janeiro, 1997
Imagens
Bibliografia
Catálogos e Folders
2010
Ana L. Muglia: “Em Obra”
Centro Cultural e Turístico
Regional Dr. Pio Soares Canêdo
Muriaé, MG
2005
Ana Muglia: “Agenda do construtor”
São Paulo, SP
2002
Ana Muglia
São Paulo, SP
1999
Ana Muglia
Valu Oria Galeria de Arte
Rio de Janeiro, RJ
Catálogos e Folders Coletivos
2014
Situações Brasília
Museu Nacional do Conjunto Cultural da República
Brasília, DF
2014
Novas Aquisições do III Concurso
Itamaraty de Arte Contemporânea
Brasília, DF
2008
Prêmio Projéteis Funarte
de Arte Contemporânea 2007-2008
página 12-16
2005
Zona Oculta: entre o público e o privado
página 14-15
Rio de Janeiro, RJ
2003
Layers of Brazilian Art
pagina 28, Faulconer Gallery
Grinnell Iowa, USA
2002
O Orgânico em Colapso
Valu Oria Galeria de Arte
página 8
São Paulo, SP
1998
Múltiplos
Valu Oria Galeria de Arte
página 7
São Paulo, SP
1996
III Salão Mam-Bahia
Museu de Arte Moderna, Bahia
página 12
Salvador, BA
1995
8
Centro Cultural UFMG
Belo Horizonte-1994
Solar Grandjean de Montigny-PUC
página 4
Rio de Janeiro-1995
1994
14° Salão Nacional de artes plásticas
Ministério de Cultura, Fundação Nacional de Arte
Fundo Nacional de Cultura
página 24
1993
Quatro Artistas do Rio
Galeria Athos Bulcão
Fundação Cultural do Distrito Federal
Distrito Federal, Brasília
1992
Ana Muglia (exposição coletiva)
Galeria de Artel UFF, Universidade Federal
Fluminense Departamento de Difusão Cultural
Divisão de Artes Plásticas
página 5
Niterói, RJ
Textos Críticos
“…DE PROPRIEDADES QUASE MUSICAIS, NO ESPAÇO EM QUE SE MOVEM OS VIVENTES”.
Fernando Cocchiarale, Novembro, 2016
Sobre a construção de “propriedades quase musicais, no espaço em que se movem os viventes”.
A exposição “… de propriedades quase musicais, no espaço em que se movem os viventes” (título extraído por Ana Muglia de trecho de Eupalinos ou O Arquiteto, de Paul Valéry) é, segundo declaração da própria artista, “uma mostra de pintura em madeira de grandes formatos, série de desenhos sobre tela crua em pequenos formatos, algumas folhas do Caderno de artista sobre suporte de madeira e base de concreto e um vídeo, cujo foco é trabalhar as semelhanças visuais e rítmicas entre o espaço da construção arquitetônica e o da estrutura musical”.
Os diferentes meios técnicos utilizados por Muglia nesses trabalhos nos remetem às categorizações convencionais que traçavam, até recentemente, as fronteiras entre pintura, desenho e escultura.
Nesse sentido, destacamos trechos de seu depoimento que, direta ou sutilmente, evidenciam o fio condutor pictórico que atravessa o conjunto de sua produção: “uma mostra de pintura em madeira de grandes formatos”, “desenhos sobre tela crua”, “Caderno de artista sobre suporte de madeira” e vídeo sobre “semelhanças […] entre o espaço da construção arquitetônica e o da estrutura musical”.
Mas para a compreensão do sentido poético específico dessa pintura de Muglia que transborda os limites convencionais entre desenho, escultura e música é necessário averiguar tanto o sistema pictórico que norteia sua fatura (a escolha dos materiais de que são construídas e que as estruturam), quanto confrontá-la com questões pictóricas e poéticas formuladas pela arte moderna e por seus desdobramentos na produção contemporânea.
A redução da pintura aos seus atributos objetivos essenciais, concentrada na reiterada afirmação do plano pictórico (oposto à representação naturalista e ao ilusionismo permitido pela perspectiva e pelo sombreado que a marcaram entre a Renascença e a modernidade) deixou clara a importância do suporte ou das superfícies em que eram pintadas.
Tais suportes conectavam a atividade pictórica propriamente dita à superfície de um plano materialmente objetivo. Era necessário vencê-lo para a o triunfo da simulação do espaço (ou da cena) que acolhia a representação. Pinturas seriam, então, inseparáveis dos diferentes espaços que as acolheram e as perenizaram milhares de anos antes da invenção da escrita, portanto, antes de qualquer narrativa histórica. Dentre esses suportes, destacam-se a parede (de cavernas, templos e palácios) e, mais recentemente, a tela e o papel.
Foi somente a partir da segunda metade do século XIX, com a formação das primeiras vanguardas europeias, que a materialidade planar do suporte pictórico se generalizou para consolidar a modernidade aspirada. A produção artística, entretanto, continuou a explorar e a aprofundar novas possibilidades poéticas inauguradas pela investigação do plano pictórico.
Já na segunda metade dos anos cinquenta, Lucio Fontana, na série de pinturas Concetto spaziale, começou a fazer incisões com navalhas ou tesouras sobre telas monocromaticamente pintadas.
As incisões de Fontana nos revelavam de imediato que, ao contrário do conceito teórico de plano (Euclides), o plano pictórico – tela − possuía concretamente uma fina espessura: um outro lado que confinava com a parede sobre a qual o quadro era situado. Havia aqui uma crítica à “dimensão planar” que celebrava a superfície do suporte da pintura modernista, destinada à composição.
Muglia ultrapassa o debate sobre o plano pictórico para extrair das entranhas da parede, invisíveis ao olhar fruidor e à compreensão habitual, a organização material, espacial e cromática de seus trabalhos. É, portanto, uma pintura de afloramento, que reconstrói tais entranhas na superfície dos trabalhos. Finalmente é preciso esclarecer que diferentemente do construtivismo histórico, baseado em noção de estrutura análoga à da engenharia do ferro, as construções da artista exploram, sobretudo, a potência pictórica dos materiais por ela apropriados da construção civil brasileira (de onde extrai a sutil precariedade de sua pintura).
SOBRE O TRABALHO “ENTRE”
Luiza Interlenghi ( curadora e crítica de Arte), trecho extraído do texto para o catálogo da exposição Pontotransição, realizada na Fundição Progresso em 2016
Fronteiras são mais que linhas imaginárias. Disputas econômicas e conflitos territoriais erguem muralhas, barricadas. Defesa e ataque bloqueiam o estrangeiro. Com o método de empilhamento de contenção de encostas e barricadas, Entre de Ana Muglia ergue partituras no espaço. Blocos sobre o piso abrem intervalos, clareiras, silêncios, tocados pelo acaso _ estranha música feitas de vazios e matéria, contenção e passagem.
TENSÃO / EXPOSIÇÃO ANA MUGLIA E RAFAEL PAGATINI
Agnaldo Farias, Rio de Janeiro, Novembro 2012
Ao contrário de aproximar trabalhos com poéticas e acabamentos semelhantes o que certamente permitiria um resultado harmônico, aqui optou-se pelo contrário. Em primeiro lugar porque num tempo em que as diferenças são sufocadas em nome de consensos tão apaziguadores quanto falsos, faz mais sentido sublinhar a existência de vozes distintas, caminhos singulares. Em segundo lugar porque produzir tensão numa área expositiva relativamente pequena, termina por aumentá-la, o que é muito bom. Mais não fosse porque é justamente esse o projeto do Escritório de Arte de Gaby Indio da Costa, que se inaugura com essa exposição: apresentar obras potentes, de autoria de artistas
comprometidos com a pesquisa e a experimentação. Arte incomoda. Esse é o princípio da coisa toda. Ana Muglia e Rafael Pagatini ilustram essa linha de pensamento. Embora sejam autores de obras diversas entre si, e pertençam a comunidades artísticas igualmente distintas, Ana mineira, Rafael, gaúcho, é fato que o aparente inacabamento dos trabalhos de Ana terminam por encontrar sua correspondência nas imagens difusas e enevoadas de Rafael.
As pinturas/objetos de Ana Muglia deixam ver o tempo dispendido em sua execução, todos os variados passos concernentes a um caminho longo, tortuoso e profundamente meditado, no qual os protagonistas são as mãos e os olhos guiados por uma engenharia fundada no improviso e na capacidade de articular elementos díspares. Há um quê de parede em suas pinturas. Ou de tapume. Qualquer coisa indecisa entre um e outro e que nasce do desejo de vedar, construir um anteparo que, ademais de sua superfície movimentada, atrai pelas frestas obtidas. Pinturas no geral, nascem do desejo de sublimar a existência das paredes em que vem fixadas.
São uma outra coisa, pretensamente mais especial. Mas não no caso de Ana que prefere produzir paredes, esse elemento que trai o desejo ancestral de isolamento, de abrigo. Como escreveu Osman Lins: “as paredes (de uma casa) impedem que nos dissolvamos na vastidão da terra. Nossa artista traz para a frente o que está por detrás, ativa-a, trabalha sobre ela até finalmente deixá-la num estado de inacabamento permanente. Vemos todas suas decisões, supressões e acréscimos, as marcas de suas ações que se vão depositando num plano que tanto pode ser grande como a parede de uma casa, como essas que ora ela apresenta logo à entrada da galeria, como nas telas de pequeno ormato,
onde esse labor resolve-se em solução camerística.
Rafael Pagatini, tanto em suas gravuras quanto em suas pinturas, opera sobre imagens. Dir-se-ia que, diversamente de Ana, cujas obras são ostensivamente materiais, ele se ocupa de uma substância impalpável e diáfana do mundo contemporâneo – afinal as imagens estão em toda parte -, empenhando-se em transformá-las em visões. O artista turva e impõe mistério às imagens, desviando-as do destino que a indústria de consumo lhes que dar, que é o de fazê-las confundir-se com a própria realidade. Para tanto, Rafael transpõe fotografias para superfícies reticuladas na tela de um computador, imprime-as em papéis, cola-as sobre telas de tecido e as vai perfurando até obliterar as imagens originais, transformando paisagens e retratos em motivos enigmáticos. Fiel a sua ética de gravador, também suas pinturas são múltiplas, uma trincheira que tem por objetivo combater o excesso de realidades com as quais somos diariamente bombardeados e cujo caráter ideológico vem oculto sob a aparência de imagens nítidas e vistosas. Da materialidade ao mistério, a tensão entre os trabalhos de Ana e Rafael, ao passo em que não se resolve, amplificam a ideia de um mundo em suspensão.
Da materialidade ao mistério, a tensão entre os trabalhos de Ana e Rafael, ao passo em que não se resolve, amplificam a ideia de um mundo em suspensão.
EM OBRA
Katie van Scherpenberg, Rio de Janeiro, Novembro de 2010
“En particulier,ce que nous appelons une “ Oevre d ´art ” est le résultat d´une action dont le but fini est de provoquer chez quel´qu ´un des développements infinis.” (Pau l Valéry, L´ínfini esthetique)
“Em particular, aquilo que chamamos uma “Obra de Arte” é o resultado de uma ação cujo final será provocar em alguém infinitos progressos.” (Paul Valéry/ A infinita estética)
A palavra Arte significa, na sua origem, uma maneira de fazer. A arte da música,da pintura,da escultura.Maneiras de fazer uma obra.
Nos trabalhos parecendo ainda em obra,inacabados, percebemos pelas frestas, nesgas de parede,sombras,áreas ainda descobertas. O tapume afinal esconde alguma coisa que está por vir.
A obra se torna um objeto que tem por fim esconder algo ainda em construção. O espectador se torna cúmplice na procura pela imagem. Como uma partitura musical que esconde a música atrás de suas pautas e que precisa do artista para ser materializado.
O que é importante neste trabalho paciente de revelação e dissimulação é a imagem sonegada ao olhar indagador. A artista constrói algo que não se percebe de imediato e temos vontade de pular o tapume a fim de vivenciar o mistério que se esconde atrás.
Não temos acesso a ele a não ser pelo conceito ou pela imaginação.
No entanto um objeto foi criado, realizado, construído; madeira, pigmentos, argila, concreto. Ela existe e está na nossa frente.
Será a imagem perdida afinal o próprio tapume?
DAQUILO QUE AS COISAS SÃO FEITAS
Paulo Reis, Rio de Janeiro, 2003
A pintora Ana Muglia “organiza” uma barricada de sacos plásticos e tecidos recheados de brita, areia e argila, retomando o modelo primordial dos materiais ainda como são usados nos seus estados naturais (como se fosse possível conceber estados naturais quando o homem se utiliza dos materiais industrializando-os para construir espaços habitáveis). Contudo, apesar de seu caráter tridimensional, não devemos ver esta obra como escultura e sim pintura, pois, nas palavras da artista: “Ainda estou fazendo pintura, pois quando disponho os elementos sob a ordem rigorosa das cores, o espaço representado é o mesmo de quando faço minhas pinturas”. Apesar de seu volume e peso _ elementos do universo da escultura, a obra, para a artista, deve ser tomada como uma pintura-objeto. Ana Muglia insere-se, com esse objeto híbrido, nas discussões da arte contemporânea a partir das heranças da arte povera, do brutalismo dubuffetiano, dos penetráveis de Hélio Oiticica, do informalismo de Burri e Tápies, do espacialismo de Fontana e de uma gama de referências na história da arte moderna.
(texto retirado do folder para a exposição itinerante “Quatro Matérias” realizada no SESC Petrópolis em 2003)
CONSTRUÇÃO DA PINTURA
Viviane Matesco, Rio de Janeiro, Julho de 2002
A riqueza de texturas nos trabalhos atuais de Ana Muglia é resultado de um processo elaborado de construção pictórica. Utiliza madeira ou tela como suporte de várias camadas de acrílica, têmpera e cimento, que ao serem misturados a pigmentos naturais, adquirem tons terrosos e cinzentos.
A introdução de vergalhões e a escavação da superfície chamam atenção para a acumulação de matéria e para os procedimentos de sua realização. Estabelece um processo que estrutura a superfície pictórica à medida que cobre e raspa as camadas inferiores para deixá-las à mostra. Tal como nos muros de Tápies a concentração de grandes densidades de matéria domina toda a superfície até se identificar com ela. No entanto, o desvendamento das camadas inferiores sugere possibilidades de profundidade e espaço que contrastam com a planaridade pictórica.
Ana Muglia constrói uma parede, mas sem um acabamento que efetive um limite. Ao contrário, deixa à mostra os rastros que permitem resgatar a arqueologia de sua construção. Estabelece um ritmo lento que faz e desfaz, acentuando muito mais um processo do que um produto acabado. Processo ambíguo, pois constrói, através da pintura, uma parede para ser sobreposta a uma outra real. Mas a parede não é uma moldura institucional, nem um limite concreto intransponível: é a constituição de uma fronteira transitável, uma maneira de ver através.
Ana Muglia afirma o fazerpictórico através de uma investigação sobre a construção do espaço. As camadas de matéria são dispostas em relação ao formato retangular das telas de maneira que suas bordas deixam transparecer as anteriores.
A ênfase na estruturação por horizontais e verticais nessas pinturas, manifesta um apego à ordenação espacial que as distanciam da gestualidade alusiva de Tápies. Mesmo a introdução de vergalhões e a escavação da superfície, que à primeira vista poderia significar um gesto de oposição, funcionam para afirmar a construção espacial. A parede aqui é uma simulação uma vez que a artista não abre mão das técnicas e da relação com o pensamento pictórico. Ela testemunha, como numa metáfora concreta da construção da pintura, tradições e intervenções inovadoras.
O muro como registro do tempo e da atividade humana é uma idéia antiga na tradição da pintura. Aqui a temporalidade manifesta-se não só pela utilização de materiais que requisitam um preparo em etapas, mas porque esse processo é refeito e vivenciado pelo espectador. Com a cadência das construções de Rothko a parede deixa de ser um limite, a tela torna-se um lugar que envolve o espectador na experiência pictórica.
A PINTURA DEPOIS DO FIM DA PINTURA
Paulo Sergio Duarte, Rio de Janeiro, Novembro de 1999
A pintura está próxima, muito próxima. Mal posso olhá-la. O trabalho eliminou a distância, e encosta o olho na superfície, como se fosse possível a aberração de um Van Gogh sem cor. A pintura, tão próxima, recua. Vaza o suporte e encosta na parede. Incorpora a parede e ao tomar conta desta parece reduzi-la à memória de uma ruína. Ou, caso queira-se, pode-se imaginar o movimento inverso. Transformado em quadro e depois de cinco séculos de desprezo pela origem, retorna o suporte onde nasceu – o primeiro – recalcado, a parede, que toma conta brutalmente da superfície. Mas este já não se encontra no estado original quando esteve preparado para receber as primeiras camadas de tintas de afresco ou mural. É a própria imagem do abandono.
Ana Muglia trabalha e promove essa simbiose impossível entre plano e superfície criando uma situaçãoonde o plano idealizado, entidade geométrica construída se confronta com a superfície, realidade empírica, palco real da atividade do pintor. Deste embate, vê-se logo, sai vitoriosa a superfície. E não poderia ser de outro modo porque uma história se impõe e não há mais lugar para mediações utópicas de uma ordem ideal euclideana e seus procedimentos íntimos da razão pura. O triunfo da realidade empírica, de suas exigências e de seus procedimentos sem máscaras é conquista do mundo e desnorteia todas as regras traçadas a priori. Por isso essa presença crua dos materiais como testemunhos de momentos sucessivos de constituição do trabalho que são chamados a conviver na superfície expondo o conflito.
Mas, notem, apesar da violência da disputa, que implica em fazer conviver cimento, ferro, tijolos, enfim, materiais duros e secos do muro, e pintura, no volume restrito do quadro, tudo se realiza com certo pudor, numa luta sem gritos e uivos, em surdina, entre a escultura plana e a pintura com volume. Ou, talvez, como representação de forças que não necessitam da extravagância e da eloquência para apresentar a cena mínima de seu teatro discreto: a pintura depois do fim da pintura.
TEXTO P/ ANA LUCIA
Reynaldo Roels, Rio de Janeiro, Maio de 1991
Trata-se, aqui, de uma pintura voltada para si mesma: para o interior de seus limites, os limites do suporte; para as camadas inferiores, abaixo da superfície da tinta _ um procedimento em que películas de pigmento são superpostas a películas de pigmento, e depois raspadas; um esforço de recuperara intenção inicial, uma estratigrafia que pretende extrair da superfície última algo que ficou oculto; por vezes, o pigmento é substituído por outro material, a chapa metálica, mas esta continua cumprindo a função de cor.
O resultado final, aquele que chega ao espectador, mesmo que ele não tenha assistido às etapas iniciais, é não apenas uma superfície escavada, reveladora do que há por trás. É também a explicitação da pintura como processo, uma conversa contínua entre o pintor e seus meios específicos, como se a cada descoberta o artista tivesse que reiniciar a indagação. As telas de Ana Lucia não são descobertas neste sentido: são, ao contrário, perguntas sempre reiteradas como a inverter o aforisma de que o artista não procura, ele encontra. Pois a única afirmação que Ana Lucia faz é que ainda sobram inúmeras possibilidades sob a superfície de seu trabalho: o que ela apresenta ao olhar é a penas uma delas.